Opinião
O imposto único
MARCOS CINTRA mcintra@marcoscintra.org
Usualmente, tanto no Brasil como em outras partes do mundo, quando se fala em reforma tributária, a questão é tratada de forma restrita. A prioridade é sempre recuperar a carga tributária líquida do setor público. Providências como o combate à sonegação, a tributação de ganhos de capital e a redução de incentivos e de subsídios são frequentemente avaliadas como meios para aumentar a arrecadação do governo. Aspectos relacionados à eficiência dos mecanismos tributários, sua equidade, seus custos, suas incidências e outros pontos importantes são relegados a segundo plano.
A ampla reforma tributária de que o Brasil necessita implica discutir todas essas questões. Porém, dentro de um contexto no qual o formulador de política econômica não se ache restrito às instituições fiscais existentes.
O Brasil tem uma estrutura de impostos das mais complexas do mundo. São inúmeras as formas de tributação. Há cerca de doze impostos e dezenas de taxas e contribuições. Enfim, uma parafernália de formas e meios de tributação que torna impossível qualquer conclusão confiável acerca das características do sistema brasileiro. Não há como saber de modo preciso se ele é ou não regressivo; quais seus impactos alocativos; qual sua eficiência. Pesquisa do Fórum Econômico Mundial classificou o sistema tributário brasileiro como o mais ineficiente entre os 117 países consultados.
Em janeiro de 1990, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, intitulado “Por uma revolução tributária”, propus um novo sistema tributário chamado Imposto Único sobre Transações. A proposta demarcou uma linha divisória entre o pensamento tributário ortodoxo, baseado na manutenção do atual sistema de impostos declaratórios, e uma corrente inovadora que propunha como base impositiva uma estrutura simples, automática, abrangente e de baixo custo, consubstanciada na tributação sobre a movimentação financeira realizada através do sistema bancário, um imposto sobre cheques.
A proposta de criação de um sistema de arrecadação de impostos fundado no princípio da unicidade tributária (single tax) tem raízes históricas que remontam há pelo menos três séculos. A dificuldade de sua implementação sempre residiu na impossibilidade de se identificar uma base impositiva suficientemente ampla para permitir a arrecadação necessária com alíquotas moderadas.
As condições para identificação de uma base capaz de atender as necessidades do Imposto Único surgiram com a verificação de que a economia brasileira contempla um nível reduzido de monetização (3% do PIB). Assim, a movimentação financeira nos bancos seria a forma encontrada para a unificação de impostos de modo eficiente e eficaz.
Há quase 20 anos estudo o Imposto Único, que já se tornou projeto em condições de ser votado no Congresso, e nos últimos dias lancei nos Estados Unidos uma nova contribuição ao debate que é o livro Bank transactions: pathway to the single tax ideal (disponível em www.amazon.com/books). A obra será uma importante referência para que a sonhada reforma tributária brasileira possa ser levada adiante em sintonia com as reais necessidades dos sofridos contribuintes brasileiros.
Marcos Cintra é doutor em Economia pela Universidade de Harvard (EUA), professor titular e vice-presidente da Fundação Getulio Vargas.
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