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quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Em acelerada contra-mão

José Renato Nalini - O Estado de S.Paulo
Noticia o Estado que o TJ paulista quer mais 2.199 comissionados (8/11, A18), e chama de polêmico o projeto de lei que cria 2.199 cargos em comissão para assistentes de juízes de primeiro grau. Salienta a reportagem, do jornalista Roberto Almeida, que o Judiciário paulista se compõe de 45 mil funcionários na ativa e de 10 mil aposentados. R$ 4,3 bilhões é o valor da despesa anual do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJ-SP) com os seus servidores. Isso equivale a 90% do orçamento do Judiciário e essa contratação elevaria em 5% o quadro atual de funcionários.
Sem entrar no aspecto polêmico, o de se delegar uma função parajurisdicional a funcionário que não foi selecionado por concurso público, outra reflexão se impõe.
Esse projeto de lei não é o único em trâmite pelo Parlamento paulista. Ainda recentemente o Órgão Especial do tribunal aprovou a criação de mais de um milhar de cargos de escrevente técnico. O argumento foi o de que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) determinara a devolução aos quadros das Prefeituras de todos os funcionários que colaboram com o setor de Execuções Fiscais.
A voz dissonante no plenário foi a deste escriba, que insiste em propor ao Judiciário uma verdadeira revolução, que não se resumiria a multiplicar Varas, unidades judiciais, quadros e cargos.
A recente divulgação do Justiça em Números, do CNJ, comprova a constatação empírica: a administração pública é a maior cliente do Judiciário. Grande parte do trabalho confiado a juízes e servidores advém da cobrança da dívida ativa estatal. São milhões os processos em curso e a cada ano as estatísticas são infladas por distribuição de outros milhares de ações.
Enfrentar esse tema não se resume a ampliar o quadro funcional. É preciso ter coragem para dizer que o Judiciário não é agente de cobrança das dívidas públicas. As execuções fiscais oferecem nível escasso de litigiosidade. A maior parte delas consiste em quantias ínfimas, que não justificam a movimentação da dispendiosa máquina judicial.
Os agentes estatais desincumbem-se do seu dever de não tergiversar com o dinheiro do povo e atulham o Judiciário com essas verdadeiras lides ilusórias. Parcela dos devedores é insolvente e não possui bens que possam garantir um processo que a lei prevê, de trâmite peculiar e cujo início é a penhora dos bens de quem não honrou a sua obrigação. Outra parcela não é mais localizável.
Por isso é que o montante imenso de mandados resulta em reduzido número de citados que satisfazem o débito. Outros nunca são encontrados, ou, caso localizados, não há bens a penhorar. Poucos são os que embargam a execução, isto é, oferecem defesa para evidenciar a ausência de razão do Estado.
É frequente que as entidades credoras anistiem as dívidas ativas de milhares de devedores. Com isso, frustra-se a expectativa de cobrança judicial e é desperdiçado o dispêndio de trabalho e de recursos do já combalido Judiciário.
Se viesse a liberar-se dessa incumbência de agência de cobrança, a Justiça poderia cuidar melhor das demais contendas. Fazendo-o com a celeridade cobrada pelo constituinte de 1988 e de difícil enfrentamento, mercê de diversos fatores.
É preciso reconhecer que o problema central da Justiça não é a insuficiência de pessoal. É o mau aproveitamento de quadros desmotivados, destreinados, incapazes de encarar os desafios de um século em que a velocidade é um signo insuperável.
Pouco adianta repetir o truísmo de que o tempo da Justiça não é o tempo da mídia, ou que a resposta rápida pode não ser a ideal. O esmaecimento dos símbolos e dos valores atinge também a função judicial. Ela é remunerada com dinheiro do povo e precisa funcionar. Tem a obrigação de responder, com efetividade e em tempo oportuno, às demandas que a sociedade formula.
O juiz é um profissional que, em tese, julga bem, sabe apreciar as controvérsias à luz do Direito. Mas não foi treinado para administrar. E quando falha a atividade-meio, está comprometida a atividade-fim.
Seria preciso haver a coragem de se entregar a administração da Justiça a profissionais capazes de imprimir o choque de gestão presente em vários discursos, mas ausente na realidade. Deixar que a competência - em sentido vulgar - alargue os funis, elimine os nós burocráticos, para que o juiz julgue. Compreendendo que julgar é solucionar conflitos reais, não se manifestar sobre formalismos, procedimentalismos, no êxtase da elaboração de peças eruditas. Prenhes de precedentes e ajustadas à doutrina, mas de nenhum significado para aquele que aguarda a resposta para um problema concreto.
Quem é que já se preocupou em apurar qual é a porcentagem de respostas judiciais que se resumem a aspectos processuais e não chegam à substância?
Qual o tempo despendido em análise dos conflitos de competência, em que colegiados discutem qual a seção ou qual a câmara ou turma encarregada de apreciar a causa, quando o que interessa para as partes é que qualquer juiz decida quem, na verdade, está com o melhor direito?
Essa produção autofágica, destinada a satisfazer requisitos internos calcados em grande parte na burocrática visão compartimentada de um Judiciário cada vez mais especializado, poderia ser considerada índice satisfatório de produtividade?
Foi essa a escala de respostas que o constituinte quis reclamar a um Judiciário proativo, também responsável por edificar uma Pátria justa, fraterna e solidária?
No momento em que a Justiça repensasse a sua missão, que não é, dentre outras anomalias, a de fazer cobrança de dívidas públicas, ela poderia melhor desempenhar o papel institucional que o povo lhe atribuiu, pela voz do constituinte.
DESEMBARGADOR DO TJ-SP, É PRESIDENTE DA ACADEMIA PAULISTA DE LETRAS

3 comentários:

  1. Interesses dos grupos econômicos poderosos que, tendo tempo e dinheiro para fazer lobie, angariam a simpatia dos que trabalham nos gabinetes e, conseqüentemente, expressivas vitórias sob qualquer pretexto. Os direitos do consumidor existem só virtualmente. Não são postos em prática...

    ASSISTA:

    ... "A ditadura dos Juízes e a corrida sobre os telhados"
    http://padilla-luiz.blogspot.com/2010/09/ditadura-dos-juizes-e-corrida-sobre-os.html

    Aposto que se surpreenderá...

    E, por favor, comente:

    Sua opinião é muito importante.

    Mostrar trabalho, por respostas condicionadas e mecanismos de solução superficial, produz para estatística de produtividade sem muito trabalho.


    É muito mais fácil e rápido buscar um único motivo para indeferir, do que analisar toda a prova para concluir pelo direito, e ainda ter que mensurar o dano!
    A improcedência de pleitos justos, com a impunidade dos maus, estimula a audácia e fomenta comportamentos ilícitos?

    .:.

    O uso da linguagem, não é novidade:

    Há 1/4 de Século, o Prof.Dr.Luiz Fernando Coelho elaborou brilhante Tese de Livre Docência:

    Teoria Crítica do Direito.

    Desnuda o Direito como instrumento de dominação.

    Resumimos, as 500 laudas da tese, na RDC-RT v.49/21-3, em 3 páginas, também em:
    www.padilla.adv.br/teses/normas

    A distorção, na aplicação do direito, o exercício superficial do poder, compromete as liberdade, democracia e dignidade?

    O povo que o aceita, como “normal”, foi "robotizado"?

    Controlando a informação e o processo de pensamento, a "indústria de consumo" transforma as pessoas em engrenagens para ampliar o lucro?

    Podemos libertar o processo de pensamento da manipulação?


    www.padilla.adv.br/evoluir/perceber
    http://www.youtube.com/view_play_list?p=9B851D9997D7B494

    Atenciosamente,
    Professor PADILLA
    http://lattes.cnpq.br/3168948157129653

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  2. Congratulo a lúcida opinião veiculada no Blog, e eu me pergunto se vamos conseguir perceber a mudança da sociedade e seus efeitos na área jurídica?

    Muitos percebem a inversão de valores:

    A segurança da ponderação profunda cedeu lugar à pressa...

    Quem se beneficia dessa crença?

    A “vida moderna” reforça engrenagem consumista, estimula a ansiedade e a pseudoreflexão, açodada e superficial, impede o mergulho sincero na essência. Pressão da socialização, uma espécie de “décifit de atenção coletiva”, que impede o juiz de cumprir sua missão de pacificar a sociedade. Isso desvincula a atividade jurisdicional da realização da Justiça o que, por sua vez, incentiva os gananciosos ao desrespeito à Lei e aos direitos. O que multiplica os litígios.

    Então, a "Cultura da Superficialidade" está ligada, também, a essa necessidade de gente para movimentar milhões de processos QUE NÃO EXISTIRIAM SE HOUVESSE CUMPRIMENTO Á LEI e respeito aos direitos.

    O que só será obtido com a o exame da ess~encia das questões pelo Judiciário.

    Ou seja, a "Cultura da Superficialidade" retroalimenta-se.

    Pensamento?
    É um processo e pode ser manipulado, coletivamente...

    http://www.padilla.adv.br/processo/pensamento/etica/

    .:.

    O povo, consumidor de bens e serviços, sofre os efeitos da cultura de superficialidade:

    O interesse dos grupos econômicos poderosos, muito dinheiro para lobistas, angariam a simpatia dos gabinetes judiciais.

    Quem perde, somos nós:

    Os direitos do consumidor existem apenas virtualmente.
    Os fornecedores não os respeitam.
    Quem busca a Justiça depara-se com a cultura da improcedência.
    É mais fácil encontrar um detalhe, como desculpa para indeferir, do que examinar todo o caso!

    Para disfarçar essa prática, em alguns casos o consumidor "vence".
    Contudo, a vitória é ilusão:
    As condenações são em valores inexpressivos, que não compensam o trabalho.


    Exemplos de distorção pela mídia:
    www.youtube.com/view_play_list?p=9B851D9997D7B494





    Como funciona a "cultura" da superficialidade?

    "É impossível saber tudo e acertar sempre; assim, a celeridade é mais importante do que a segurança." isso é uma falsa relação de causa e efeito!

    O exame cuidadoso aumenta as chances de escolhas corretas.
    A solução rápida amplia a quantidade e a gravidade dos erros. Pior, transforma justiça, que deveria ser algo muito sério, numa loteria:
    Vencer não significa efetivamente ter razão:
    A vitória é de quem tem influência, desfruta de simpatia, ou tem muita sorte...

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  3. Interessante.
    É preciso, porém, entender que essa luz é decorrente de apenas um lado do prisma.
    Há uma soma de fatores que promovem barreiras a efetividade do exercício judiciário.
    Além disso, será que o judiciário pretende verdadeiramente por termo as lides e implantar a paz social decantada?
    Há de se lembrar que, o judiciário, tal qual dono de funerária, carece da morbida desgraça alheia para manter-se vivo; justificar-se.
    Sem o caos, pra que uma instituição de ordem?
    Não se pretende com isso depreciar o papel do judiciário, mas daí conferir a guarda da sociedade e a instigação da paz sem que haja uma verdadeira revolução ética e uma sincera promoção de elevamento moral dos homens é querer colocar pano novo em vestido velho.

    Marcos

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