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quinta-feira, 13 de agosto de 2009

DA ESCRAVIDÃO À CTPS

O texto abaixo é uma contribuição à Turma de Direito da Unime que se forma no semestre vindouro, da qual fui professor e que tive a honra de ser um dos homenageados. O texto constará no caderno de formatura.

escravidao

Alguns dizem que o trabalho é um castigo para o homem, o que não procede.

Mas, em contrário, o homem é escravo do trabalho.

Desde os primórdios, por sua necessidade de sobrevivência, o homem trabalha.

O trabalho, ainda que enobreça o homem, é cansativo e nem todos nutrem amor pelo mesmo, considerando que algumas atividades, mesmo na sociedade moderna, são penosas e degradantes, porém, não menos necessárias.

Com o trabalho, abriu-se à humanidade a possibilidade do acúmulo de riquezas, e, que, em razão lógica do contrário, acumular riquezas significa alijar alguém da propriedade do mesmo bem, do dividir em comum.

Com o acúmulo de riquezas e o desprezo moral pelo trabalho, especialmente quanto as atividades que nem todos gostam de realizar, alguns perceberam que o poder da riqueza lhes garantia a obtenção das atividades, prestadas por outras pessoas, submetidas a ordem e poder de vida, e posteriormente, a contratos.

Nossa sociedade, diferente do que se praticava no Oriente Médio e na própria África, nascida das aventuras lusitanas, criou um modelo inicial de mão-de-obra que se pautava por subjugar outro ser humano, reduzindo-o à condição de escravo, para fins do trabalho que não se queria realizar com as próprias mãos.

Hoje, a condição de trabalho se dá pelo contrato, em face da necessidade de sobrevivência. A venda do corpo, da força e do intelecto se dá pela remuneração, de forma injusta, na grande maioria das vezes.

Mesmo após séculos, o homem continua servo do trabalho, porém, o sistema jurídico não mais permite que o homem seja escravo de outro homem, para fins de satisfazer as tarefas a que todos necessitam. Existem várias formas de trabalho, mas há aqueles que ainda estão na esfera da intimidade da família: doméstico, acompanhante de saúde, professores particulares, dentre outros, sempre para atender as necessidades humanas.

O nosso sistema jurídico regula rigidamente o contrato de trabalho, cujos contornos, ainda que livre às partes para aderir e pactuarem, são previstos em norma pública. A carteira de trabalho e previdência social é uma das normas instituídas e é de extrema importância para o trabalhador, bem como em benefício da prova constituída para o empregador que respeita a lei.

Mas um elemento atual é bastante significante para expressar o avanço das relações entre homens, trabalho, remuneração, necessidade e sobrevivência. Os direitos do homem (DUDH)* afirmam que nenhum homem pode ser reduzido a uma situação de escravidão ou servidão, e, assim, o direito moderno tanto combate a forma atual de escravidão, como confere ao homem a possibilidade de se libertar dos grilhões, rescindindo o contrato.

O discurso atual dos empresários é o pleito de flexibilização do contrato de trabalho, sem conceder maiores fundamentos do tal pleito, muito menos como respeitarão os empregados, pois a visão é quase que exclusiva pelo lucro.

Os esforços dos empresários não deveriam ser dirigidos aos empregados no primeiro momento, mas ao Governo que regula a vida econômica, pois o que é pesado no contrato de trabalho não é o empregado em si, mas o ônus social, previdenciário e tributário decorrente do contrato.

Como flexibilizar um contrato que é frágil pelo conteúdo econômico? Como flexibilizar uma lei (CLT), se ela alcança apenas 10 e 15% dos empregados formalmente registrados, que possuem sua CTPS assinada?

O grande entrave brasileiro é o ônus econômico decorrente do contrato de trabalho, que se tornou num contra-senso: é pouco para que ganha 1 salário mínimo, mas é muito pesado para o empregador pagar 1 salário mínimo, devidos aos custos implícitos ao contrato.

O que precisa mudar no Brasil é a capacidade econômica, a produção de riqueza e a distribuição da renda, pois somos um dos países do mundo de maior concentração de renda e que gera prejuízo para os pobres, aviltando-lhes a dignidade da vida e da existência, excluindo-os das oportunidades em sociedade.

Quando alcançarmos esse patamar econômico, ninguém se preocupará em deixar de cumprir a CLT, em ter receio de ser processado na Justiça cidadã do Trabalho, pois a satisfação econômica apaziguará os ânimos das pessoas, assim como as oportunidades de trabalho e de renda serão plenos.

Somos um País extremamente rico para alcançarmos esse patamar, assim como várias outras nações já alcançaram. Precisamos apenas de boa vontade e esforço coletivo, cultura que ainda não possuímos, pois o antigo modelo português ainda vige em nosso seio social.

Eis a forma sintética que constará do livro de formatura:

"O trabalho nos acompanha desde o início da jornada humana.

O poder e o acúmulo de riquezas fizeram com que homens escravizassem homens.

O avanço do Direito rompeu com esse tipo de degradação.

O desafio moderno é a manutenção dos direitos que asseguram a dignidade humana e a valorização do trabalho, no desafio cotidiano da jornada do homem pelo sustento em conciliação com o avanço das relações de troca e do lucro."

João Damasceno.

*Art. IV da Declaração Universal dos Direitos Humanos

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