Colarinho branco: Madoff e a leniência no Brasil
"Acusados de grandes crimes financeiros no Brasil não têm por que temer um processo similar ou uma condenação como a de 150 anos de prisão imposta ao financista Bernard Madoff, nos Estados Unidos. Grandes fraudes domésticas, como o caso Banestado ou o megarrombo do Banco Nacional, guardadas as proporções, ilustram as distintas condições de investigação, julgamento e condenação nos dois países".
Essa avaliação é a introdução de reportagem na edição desta terça-feira na Folha (acesso a assinantes do jornal e do UOL), em que procuradores da República e advogados comentam as diferenças nos processos envolvendo crimes de colarinho branco no Brasil e nos Estados Unidos.
Sobre o mesmo tema, o Blog consultou o juiz federal Sergio Fernando Moro, de Curitiba, que, entre outros escândalos relevantes, julgou o caso Banestado, uma megalavagem de dinheiro estimada em US$ 20 bilhões.
Blog - Há, no Brasil, casos semelhantes ao do financista Bernard Madoff ainda não julgados?
Sergio Fernando Moro - Há casos de proprietários de instituições financeiras, bancos ou consórcios principalmente, acusados de apropriarem-se indevidamente do dinheiro que lhes foi confiado.
Blog - Como o sr. avalia a celeridade na condenação, nos Estados Unidos, diante da morosidade do Judiciário no Brasil, onde os processos por crimes de colarinho branco se arrastam por muitos anos sem punição?
Moro - Processos por crimes de colarinho branco, inclusive crimes contra o sistema financeiro, dificilmente encontram um fim no Brasil, considerando cumulativamente o sistema generoso de recursos, aliado ao entendimento do STF de que a prisão está condicionada ao trânsito em julgado, e a prescrição que corre mesmo durante a ação penal. Não obstante, há exceções de condenações. Dentre elas envolvendo o famoso caso do Banco Santos, ainda em trâmite. Tive dois processos de certa magnitude envolvendo donos de consórcio e que chegaram ao final, um deles foi condenado e até cumpriu pena (embora de seis anos de reclusão, ficando na prática um ano preso), outro foi condenado a prestação de serviços, mas devolveu pelo menos parte do numerário desviado. Essas exceções, que sequer são grande exemplo de rigor, não infirmam a regra de quase total leniência do Judiciário brasileiro em relação ao crime de colarinho branco.
Blog - Como o sr. vâ as diferenças na condução do processo, a questão do direito de defesa e a exposição dos acusados?
Moro - A foto do Sr. Madoff portando algemas foi divulgada no Brasil em oposição à sumula do STF segundo a qual a utilização de algemas deve ser excepcional. Concordo com o STF com a utilização excepcional de algemas em audiência, mas discordo, respeitosamente, no ato de prisão e no de condução do preso, no qual o emprego delas deve ser regra. De todo modo, há certo simbolismo na divulgação da foto e falta de equivalentes no Brasil, a retratar a leniência geral do Judiciário para esse tipo de crime. Imagens valem mil palavras.
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