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domingo, 14 de dezembro de 2008

Eles, juízes, segundo os advogados

Sinceramente, penso que se cada juiz trabalhasse focado nas tarefas que deve desempenhar, os comentários abaixo sequer teriam fundamentação.

Mas, como Piero Calamandrei já escreveu e tantos outros livros históricos, como a Bíblia, relatam que exercer a função de juiz nunca foi fácil, por ser necessária a vigilância contra si mesmo e pelo apelo que o Poder exerce para facilitar a corrupção, os favorecimentos, as injustiças, os privilégios, as indolências e a pusilanimidade.

Sendo assim, o texto abaixo é verdadeiro, devendo ser feita a ressalva quanto ao número menor de profissionais que não se encaixam no quanto descrito, de tal modo que sempre estamos falando das exceções, quando deveria ser o contrário.

Basta que cada um faça seu trabalho, com dignidade e diligência.

João Damasceno.

O que os juízes deveriam saber sobre o que nós, advogados, deles pensamos

Por Gentil Pimenta Neto, advogado no Rio de Janeiro (RJ).

Relações com a sociedade

  • Não se deixe contaminar pela síndrome da “juizite”. Isso o torna amargo, hipócrita, intolerante e repudiado por todos que o rodeiam, além de ser um comportamento incond izente com o cargo para o qual fora investido e que requer imparcialidade, brandura, carisma, e, acima de tudo, serenidade.
  • Fazer o estilo de “mauzão” não o tornará uma figura mais importante, tampouco aumentará sua sabedoria. Tente o contrário, seja amável e generoso, e descobrirá que, além de contribuir para um mundo mais justo, todos o admirarão ao invés de o hostilizarem.
  • Ser juiz não o torna mais viril nem mais inteligente que os outros, apenas o qualifica na posição de julgador. Por isso, seja humilde, pois aquele que lhe concedeu a sabedoria foi o mais humilde dos homens.
  • Não se ache melhor e mais sábio que um advogado, extrapolando os limites de sua toga só porque é juiz. Lembre-se que sempre haverá advogados mais bem preparados que um juiz em razão de seus largos anos de experiência, o que provavelmente ainda lhe falte, pois “título” nunca foi sinônimo de sabedoria.
  • Tente lembrar-se de vez em quando que Platão, Sócrates, Aristóteles e todas as celebridades históricas do passado pereceram um dia, assim como V. Exª. perecerá. Faça sua parte, seja justo para que seus pares se lembrem de V. Exª. como um bom exemplo de justiça, e não apenas como mais um que passou por aqui.

Vida particular

  • Se estiver brigado com sua esposa, marido, filhos ou amigos, não descarregue em cima das partes e muito menos dos advogados. Eles, assim como V. Exª., também têm família e problemas.
  • V. Exª. sabia que maioria dos advogados também tem família? Isso mesmo… Eles também fazem compras no mercado, levam filhos à escola, vão a bancos, etc., e, exatamente como V. Exª., têm acúmulo de serviço. Por isso, não os ridicularize dando-lhes prazos de 48 horas ou 3 dias para que cumpram determinado ato processual, assim como V. Exª. também não é capaz de cumprir os prazos que a lei lhe impõe e que são muito maiores.

Estado e Ministério Público

  • Nos processos em que figure o MP não faça deles um “ping-pong”, proferindo despachos do tipo: “ao MP”; “às partes”; “ao MP”; “às partes”. Preste atenção e tente perceber se o que o MP requer não se trata de uma estultície, como o é em inúmeras vezes, e que só serve para atrasar o feito. Tratando-se de parvoíces, ignore-as.
  • Nos processos em que o réu é o Estado, não aja com hipocrisia tentando protegê-lo nas entrelinhas com seu corporativismo bolorento. Isso é coisa do passado e V. Exª. tem autonomia suficiente para ficar do lado de quem tem razão. Afinal, essa é a função do magistrado, ou não?

Provas

  • Não peça às partes que comprovem o óbvio ou o impossível, como de hábito alguns magistrados procedem ao exigir a prova diabólica do direito medieval, como então se considerava a prova de fato negativo.

Audiências

  • Em audiência, não precisa exibir sua força às partes. Força qualquer um tem. Demonstre apenas aquilo que todos esperam de você: sabedoria, imparcialidade e justiça.
  • Em audiência, quando o autor ou o réu tentarem desesperadamente lhe dizer algo, não os mande calar a boca. Saia de seu pedestal egocêntrico e preste atenção ao menos por um minuto ao que eles têm a lhe dizer. Pode ser que ouça aquilo que uma brilhante petição não conseguiu fazer.
  • Não é necessário ameaçar partes e advogados em audiência dizendo que mandará prender, só porque conta com um aparato policial à sua disposição pago pela sociedade (nós). Isso só servirá para denegrir sua própria imagem, porque ao final tudo acabará mesmo em “pizza”.
  • Não marque audiências desnecessárias só para perguntar às partes se desejam transigir quando os fatos permitem que o faça por simples publicação. Menos audiências, menos burocracia, menos exposição das partes e menos lentidão processual. Todos ganham com isso.

Decisões

  • Antes de indeferir pedidos liminares, reflita um pouco mais e não julgue pelas aparências. Você não está sendo bonzinho em concedê-las, estará cumprindo sua função jurisdicional e dando a resposta imediata que a sociedade espera de você. O perigo de dano irreparável deve sempre preceder o princípio da ampla defesa.
  • Quando der uma decisão, faça-a de modo claro, evitando despachos ignominiosos tais como: “emende a inicial”. Especifique onde está aquilo que para si é um erro e que muitas das vezes, além de não o ser, passou despercebido pelo causídico. Afinal, errar é humano. Ou será que V. Exª. nunca errou?
  • Quando uma das partes lhe postular algo, decida entre conceder ou não conceder. Não seja omisso fingindo que não viu só para não sofrer agravo. Se tiver que dizer não, seja honesto e diga-o logo, porque a omissão é mais abominável que um NÃO e gera sublevação.
  • Quando tiver que julgar uma ação improcedente, porque os fatos, as provas e os argumentos já o convenceram disso, julgue-a, mas faça logo, sem enrolação dissimulada de anos a fio com despachos medíocres e repetitivos de “certifique-se”. É melhor um NÃO logo de início que ao cabo de vários anos de sofrimento.
  • Prefira menor quantidade de sentenças proferidas no mês, lendo com atenção as petições, contestações e réplicas, com Justiça e carinho, que atropelar petições para cumprir metas da Corregedoria, causando uma injustiça maior. Afinal, V. Exª. tem autonomia para isso, e só dessa forma o Estado contratará mais juízes.
  • Quando for julgar os danos morais sofridos por alguém, calce suas sandálias por alguns minutos e tente perceber o drama vivenciado, avaliando se V. Exª. ficaria satisfeito com o ridículo valor que pretende arbitrar e que provavelmente só servirá para causar injustiça ainda maior. Saia um pouco do mundinho atrasado em que vivemos e tente lembrar das condenações milionárias dos países desenvolvidos. Essas sim, por seu caráter expiatório, desestimulam o ilícito.
  • “Decida sempre como se de sua decisão dependesse a vida de alguém: por vezes depende. Decida sempre e sempre como se o interessado fosse seu irmão: ele o é.” (Desembargador Marcus Faver).

Honorários

  • Ao fixar o percentual de sucumbência, seja sincero e consciente, ao menos apreciando o bom trabalho do advogado, conforme pretendeu o legislador quando da criação do § 3º do art. 20 do CPC. E se o causídico for merecedor dos 20%, não tenha medo, conceda-os. V. Exª. não necessita fazer como a maioria, demonstrando seu desprezo ao advogado, fixando sempre os malsinados percentuais de apenas 1%, 2%, 5% ou 10% de honorários sucumbenciais.
  • Lembre-se que é dos mandados de pagamento que sobrevivem os advogados, que por vezes passam 5 ou 6 anos aguardando um deles. Portanto, quando estiver o valor da execução já depositado, mande expedi-lo logo. Não enrole mais só porque o valor é alto.
  • Nas emissões de mandados de pagamento, se o advogado pedir que seja expedido em seu nome e a procuração lhe conferir esse direito, não finja que não viu, mandando expedi-lo em nome da parte. Em que pese a existência de advogados, juízes e desembargadores desonestos, os litigantes desonestos são em maior número que aqueles.
  • O § 4º do art. 20 do CPC foi criado pelo legislador para que magistrados possam fixar um valor de sucumbência compatível com o tipo da ação e o trabalho do advogado nos casos em que o valor da causa for irrisório – e não o contrário. Há casos em que alguns magistrados chegam a fixar a sucumbência em R$ 100,00. Essa quantia não paga sequer uma consulta.

Recursos

  • Entenda que o agravo não é uma afronta à sua inteligência, mas como o manejo de uma ferramenta criada pelo legislador para corrigir erros de magistrados que, assim como qualquer um, também são suscetíveis a falhas. Querer se vingar disso só fará aumentar a injustiça e não atingirá o advogado como por vezes pretende. Ao contrário, estará prejudicando aquele que depositou sua última esperança em você.

Um comentário:

  1. Andreia C. S . de Melo24 de agosto de 2009 às 04:04

    Exelente observaçoes feitas pelo Colega Dr. Gentil. Ele conseguiu listar quase todos os problemas que existem no relacionamento entre Advogado e Magistrado. Parabéns.

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