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sábado, 22 de novembro de 2008

A SUPOSTA POLÊMICA POR CAUSA DO PEDÁGIO, SEGUNDO A TESE DE UMA ALUNA DO RS

É impressionante como os jornais difundem notícias sem sequer colher outras informações para dar parâmetros e possibilitar conclusões aos leitores, ao invés de induzi-los à bitolagem.
Já recebi tantos e-mail´s dessa notícia que circula sobre a tese de uma aluna, defendida numa Universidade do Rio Grande do Sul, e tendo respondido a todos, que me vejo obrigado a postar no Blog para torná-la pública e combater a má informação do referido jornal gaúcho.
Com toda franqueza, é simplesmente inconcebível que a aluna, após ter cursado 5 anos de Direito, tendo estudado, presumo, Dir. Civil (propriedade e contratos), Dir. Administrativo (contratos públicos), Dir. Tributário e Dir. Constitucional; tenha a "coragem", para não dizer outra coisa, de sustentar uma maluquice jurídica como a noticiada, cujo conteúdo segue abaixo.
Pela notícia veiculada no jornal, mesmo sem conhecer os fundamentos da monografia, entendo que a aluna está mais que equivocada.
Vejamos:
Não há que se falar em inconstitucionalidade da cobrança do pedágio porque o inc. V do art. 150 da CF autoriza referida cobrança.
"(das limitações do poder de tributar)
Art. 150... 
V - estabelecer limitações ao tráfego de pessoas ou bens, por meio de tributos interestaduais ou intermunicipais, ressalvada a cobrança de pedágio pela utilização de vias conservadas pelo Poder Público;" (Grifamos).
Semelhantemente ao que aprendemos com a Bíblia, no Direito não se pode analisar um item isoladamente, mas a boa interpretação deve ser feita de forma sistemática, pois, afinal de contas, convivemos debaixo de um Sistema Jurídico, um feixe de normas que condiciona o comportamento de cada cidadão.
Vivemos sob um sistema constitucional e dentro dele há vários sub-sistemas, especialmente o sub-sistema constitucional tributário.
A previsão de ser livre a locomoção em todo território sem impedimento quanto aos bens não exime por si só quanto ao pagamento de tributos.
Tributo é gênero, cujas espécies são: impostos, taxas, contribuições de melhorias, contribuições sociais (que também se dividem em várias outras, incluindo a previdenciária), empréstimos compulsórios (da época do Sarney, lembra?) e impostos em face de calamidade ou guerra.
Todos as espécies possuem definições jurídicas próprias.
As definições jurídicas não se apegam ao nome dado ao que se cobra, podendo receber título, alcunha, nome ou apelido, como, por exemplo: "bilu-bilu". Porém, se está sendo cobrado por via estatal ou concessão, é tributo (gênero). Ou, na melhor acepção jurídica, cobrança mediante concessão é tarifa pública.
O pedágio se assemelha às taxas, ainda que comporte discussão se se trata de taxa ou tarifa pública, que não vem ao caso nesta curta exposição. Taxas que, por sua vez, possuem a seguinte definição, conforme o art. 77 do Cód. Tributário Nacional:
"Art. 77. As taxas cobradas pela União, pelos Estados, pelo Distrito Federal ou pelos Municípios, no âmbito de suas respectivas atribuições, têm como fato gerador o exercício regular do poder de polícia, ou a utilização, efetiva ou potencial, de serviço público específico e divisível, prestado ao contribuinte ou posto à sua disposição."
Poder de polícia: fiscalização, vigilância sanitária, polícia de trânsito, etc.
Serviços públicos: cartórios, custas judiciais, iluminação pública, pedágios, guinchos, estacionamento, etc.
Toda pessoa é livre para transitar com seus bens sem que se necessite de autorização prévia, como ocorria nos países comunistas e nos poucos que ainda subsistem.
É sim uma questão de liberdade de ir e vir, mas não exime o pagamento de tributos, especialmente as taxas.
Liberdade para transitar com os bens, mesmo pagando tributos, remete-nos ao impedimento do Estado em cobrar tributos, seja lá sob qual nome for, inclusive taxas, com valores ou alíquotas tão elevadas que se transformariam em verdadeiro confisco (vedado pela CR) ou impediria a pessoa de transitar, fazendo-a desistir da viagem e da sua liberdade de ir e vir, já que o elevado tributo a faria perder o bem e a viagem em si, além de obviamente, coartar sua liberdade, bem maior defendido pela CR.
É dentro desse parâmetro que se encaixa a liberdade de transitar com os bens.
Pois, do contrário, não só a CIDE dos combustíveis seria inconstitucional, mas igualmente o ICMS, o IPI, o PIS, a COFINS e tantos outros, visto que, no caso do ICMS e do IPI são impostos que justamente gravam a circulação de riquezas entre pessoas. Levando o raciocínio da aluna ao pé da letra, segundo o que ela propôs, não seria possível comprar um bem fabricado em SP.
Assim, ninguém poderia ou deixaria de comprar feijão, mortadela, farinha, carro, televisão, computador, etc.
A CIDE, contribuição social, está prevista no art. 149 da CR e em momento algum informa que se destinará às estradas.
É tributo de intervenção no domínio econômico com o objetivo de coibir o cartel, o monopólio, o oligopólio, ou reverter investimentos para outro setor deficitário da economia, como no caso do álcool combustível, etc.
Penso que foi uma grande desculpa do governo para arrecadar mais, pois nosso parque industrial em sentido amplo é composto por monopólio ou oligopólio, basicamente. E veja que só temos CIDE para combustíveis e para remessa de lucros para o exterior.
Existem tantos outros grandes monopólios ou oligopólios e que o Governo não faz incidir a CIDE: cimento, alumínio, fumo, bebidas, eletricidade, etc. Contudo, tais itens elevariam o preço de produtos e serviços, afetando gravemente as classes mais pobres. Mas, ainda assim, autorizado genericamente o Estado está, podendo conceder imunidade ou isenção às classes mais pobres.
A contrário do quanto noticiado, a CIDE dos combustíveis em verdade é inconstitucional por não ter sido criada por lei complementar, como exige o art. 149 da CR.
É a Lei n. 10.336/01 quem regula a mesma e em momento algum dispõe que o dinheiro arrecadado será destinado a conservação de estradas. Confira-se:
"Art. 1º Fica instituída a Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE) incidente sobre a importação e a comercialização de petróleo e seus derivados, gás natural e seus derivados, e álcool etílico combustível (Cide), a que se refere os arts. 149 e 177 da Constituição Federal, com a redação dada pela Emenda Constitucional no 33, de 11 de dezembro de 2001.
§ 1º O produto da arrecadação da Cide será destinada, na forma da lei orçamentária, ao:
I - pagamento de subsídios a preços ou transporte de álcool combustível, de gás natural e seus derivados e de derivados de petróleo;
II - financiamento de projetos ambientais relacionados com a indústria do petróleo e do gás; e
III - financiamento de programas de infra-estrutura de transportes."
Por financiamento de programas de infra-estrutura pode-se incluir diversas intenções governamentais, inclusive a construção de estradas, ferrovias, aerovias, portos, etc.
Equivocado raciocínio também suscitam acerca do IPVA, vez que seu perfil jurídico não impõe destino quanto a arrecadação.
Concluindo, a pretensão de não pagar pedágio sob a alegação de duplicidade não existe.
A monografia da aluna padece de equívoco grave quanto a Ciência tributária, além das demais pertinentes, como Dir. Financeiro, Dir. Administrativo, Dir. Constitucional e Dir. Civil, conforme exposto pela notícia jornalesca.
Ademais, segundo os argumentos da aluna, abaixo consignada na notícia veiculada, dizendo que: "as estradas não são vendáveis" e que "empresas de pedágios são particulares e que não se confundem com o Estado e serviço público". Quanta limitação de raciocínio e quanta indução à burrice.
Como dizia meu saudoso professor Accyoli, quando o aluno fazia uma pergunta non sense: "não chegue perto porque burrice é contagiosa e pega!"
É um atestado claro de si mesma que não conhece o Direito brasileiro e outros comparados.
Que o físico "estrada" não seja vendável é até aceitável, mas explorá-la como serviço público é perfeitamente possível, dentro do nosso Sistema Jurídico, mediante concessões. Pois, do contrário, seguindo o raciocínio estanque da aluna, seria impossível ao Estado vender petróleo, minerais, florestas, água tratada, fazer linhas férreas, usinas nucleares, hidro ou termoelétricas, pesca no mar e em rios, e tantos outros exemplos da exploração da riqueza nacional necessárias ao nosso conforto e necessidades.
Assim como seria impossível a cobrança de tarifa pelos transportes públicos coletivo, inter-estaduais, marítimo, férreo e de aviação, que são explorados por entes privados (empresas) mediante concessão, através de licitações e outras formas de contratos públicos. Seria impossível a concessão ou permissão de ensino por entes privados, caso da Faculdade onde a aluna estudou, mediante pagamento de mensalidades, pois, todos estes casos são de competência de prestação de serviço público, que o Estado lança mão da concessão aos entes privados para efetivar sua responsabilidade em prestar o serviço necessário à sociedade.
Tais empresas, que são regidas pelo Dir. Privado, no campo da responsabilização e contratos, não lhes retira o caráter público, pelo regime da concessão, substituindo a pessoa e a atuação própria do Estado, mas a empresa funciona como substituta, preposta do setor público, do Estado. A cobrança que tais entes privados fazem é de taxa ou tarifa, com preferem alguns doutrinadores administrativistas, sendo uma das espécies do gênero tributo. Tanto é verdade que o Estado faz leilão de serviços, contratando-os ou concedendo o direito de explorar tais atividades, mediante licitação pública e vinculando-as ao cumprimento da oferta pública do serviço.
É evidente que tais contratos são passíveis de revisão e intervenção do Estado, mas é outra seara e nada tem a ver com a sustentada ampla e irrestrita liberdade de ir e vir do cidadão.
Outra afirmação da aluna é se o policial da PRF trabalharia para o Estado ou para empresa concessionária que cobra pedágio. Sim, ele é servidor público do Estado, como militar, com regime próprio, mas é justamente o fiscal do cumprimento da lei e das normas jurídicas, e, verificando qualquer forma de infração, pode e deve conduzir o infrator a adimplir sua desobediência, seja ela penal, civil ou administrativa.
Apesar do sucesso em jornal, se eu estivesse na banca, minha nota seria pela reprovação da tese suscitada.
Entretanto, faço a ressalva de não conhecer os fundamentos da monografia. Porém, pelo quanto noticiado, a tese é infundada.
Esse é o parecer, s. m. j.João Damasceno.

“O DIREITO DE IR E VIR BARRADO PELOS PEDÁGIOS...
Entre os diversos trabalhos apresentados, um deles causou polêmica entre os participantes.
"A Inconstitucionalidade dos Pedágios", desenvolvido pela aluna do 9º semestre de Direito da Universidade Católica de Pelotas (UCPel) Márcia dos Santos Silva chocou, impressionou e orientou os presentes.
 A jovem de 22 anos apresentou o "Direito fundamental de ir e vir" nas estradas do Brasil. Ela, que mora em Pelotas, conta que, para vir a Rio Grande apresentar seu trabalho no congresso, não pagou pedágio e, na volta, faria o mesmo. Causando surpresa nos participantes, ela fundamentou seus atos durante a apresentação.
Márcia explica que na Constituição Federal de 1988, Título II, dos "Direitos e Garantias Fundamentais", o art. 5º diz o seguinte:
"Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade"
E no inciso XV do artigo:
"é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens".
A jovem acrescenta que "o direito de ir e vir é cláusula pétrea na  Constituição Federal, o que significa dizer que não é possível violar  esse direito.
E que todo o brasileiro tem livre acesso em todo o território nacional. O que também quer dizer que o pedágio vai contra a Constituição.
Segundo Márcia, as estradas não são vendáveis. E o que acontece é que concessionárias de pedágios realiza contratos com o governo Estadual de investir no melhoramento dessas rodovias e cobram o pedágio para ressarcir os gastos. No entanto, no valor da gasolina é incluído o imposto de Contribuição de Intervenção de Domínio Econômico (Cide), e parte dele é destinado às estradas. "No momento que abasteço meu carro, estou pagando o pedágio. Não é necessário eu pagar novamente. Só quero exercer meu direito, a estrada é um bem público e não é justo eu pagar por um bem que já é meu também", enfatiza.
A estudante explicou maneiras e mostrou um vídeo que ensinava a passar nos pedágio sem precisar pagar. "Ou você pode passar atrás de algum carro que tenha parado. Ou ainda passa direto. A cancela, que barra os carros é de plástico, não quebra, e quando o carro passa por ali ela abre. Não tem perigo algum e não arranha o carro", conta ela, que diz fazer isso sempre que viaja.
Após a apresentação, questionamentos não faltaram.
Quem assistia ficava curioso em saber se o ato não estaria infringindo alguma lei, se poderia gerar multa, ou ainda se quem fizesse isso não estaria destruindo o patrimônio alheio. As respostas foram claras.
Segundo Márcia, juridicamente não há lei que permita a utilização de pedágios em estradas brasileiras.
Quanto a ser um patrimônio alheio, o fato, explica ela, é que o pedágio e a cancela estão no meio do caminho onde os carros precisam passar e, até então, ela nunca viu cancelas ou pedágios ficarem danificados.
Márcia também conta que uma vez foi parada pela Polícia Rodoviária, e um guarda disse que  iria acompanhá-la para pagar o pedágio. "Eu perguntei ao policial se ele prestava algum serviço para a concessionária ou ao Estado. Afinal, um policial rodoviário trabalha para o Estado ou para o governo Federal e deve cuidar da segurança nas estradas. Já a empresa de pedágios, é privada, ou seja, não tem nada a ver uma coisa com a outra", acrescenta.
Ela defende ainda que os preços são iguais para pessoas de baixa renda, que possuem carros menores, e para quem tem um poder aquisitivo maior e automóveis melhores, alegando que muita gente não possui condições para gastar tanto com pedágios. Ela garante também que o Estado está negando um direito da sociedade. "Não há o que defender ou explicar. A constituição é clara quando diz que todos nós temos o direito de ir e vir em todas as estradas do território nacional", conclui.
A estudante apresenta o trabalho de conclusão de curso em novembro de 2007 e forma-se em agosto de 2008. Ela não sabe ainda que área do Direito pretende seguir, mas garante que vai continuar trabalhando e defendendo a causa dos  pedágios.”
FONTE: JORNAL AGORA

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